Artigo | Psiquiatra João Adolfo Mayer alerta sobre os riscos do consumo excessivo de álcool


Um em cada cinco universitários brasileiros está sob risco de desenvolver dependência ao álcool, de acordo com recente levantamento realizado em universidades públicas e privadas do Brasil, pesquisa essa encomendada pela SENAD (Secretaria Nacional Antidrogas). Os dados revelam que o jovem brasileiro começa a beber cedo - 80% dos universitários com menos de 18 anos responderam já ter consumido bebida alcoólica. Quanto mais precoce o uso de álcool, maiores as chances de desenvolver dependência. Jovens de 18 a 24 anos, no entanto, são os que mais bebem. O consumo pesado episódico, ou binge drinking (cinco ou mais doses para homens e quatro ou mais doses para mulheres, num período de duas horas), atinge um patamar preocupante. Um em cada quatro universitários afirmou ter bebido nesse padrão nos 30 dias anteriores à pesquisa.

O consumo de álcool é dito "hábito" a partir do momento em que o indivíduo o utiliza sempre que precisa relaxar, diminuir a ansiedade ou dormir; para evitar pensar em coisas tristes ou ruins; ou como forma de socialização. O consumo se mostra "fora de controle" (abusador) quando o indivíduo passa a se preocupar com a constância do suprimento da substância alcoólica; procura esconderijos para bebidas a fim de que ninguém em casa perceba o aumento do uso; ou, em eventos sociais, utiliza "doses extras" escondido dos outros. O consumo se torna "problemático", a denotar já uma dependência orgânica (alcoolismo), quando a ingestão de álcool sempre extrapola o planejado; a tentativa de se abster do seu uso não passa de alguns dias (compulsão); o consumo atrapalha o desempenho profissional e doméstico; o indivíduo não se lembra do que aconteceu enquanto estava sob efeito do álcool (apagões); e o não fazer uso de álcool por algum tempo causa síndrome de abstinência (tremores, inquietação, insônia e sintomas físicos tais como suar,vomitar,mal estar generalizado, nos casos leves, ou agravamento desses sintomas, além de desorientação no tempo e espaço, alterações da consciência, agitação motora severa,terríveis alucinações visuais do tipo zoopsias (visões com animais terrificantes, com apresentação de forma cinematográfica, geralmente em preto em branco, e de maior surgimento no período noturno) e delírios ( idéias persecutórias) nos casos mais graves.

O uso de álcool provoca diversos efeitos, que aparecem em duas fases distintas: uma estimulante e outra depressora. Nos primeiros momentos após a ingestão podem aparecer efeitos estimulantes como euforia (alegria exagerada) falta de inibição motora, autocrítica prejudicada e falar de forma incontida. Com o passar do tempo, surgem efeitos depressores, como tristeza, falta de coordenação motora, descontrole no sono. Quando o consumo é exagerado, o efeito depressor fica exacerbado, podendo desencadear ainda reações desagradáveis como rubor da face, dor de cabeça, vômitos, mal-estar geral, tonturas ou mesmo levar ao coma.

Há desconhecimento pela maioria da população de que o álcool é uma droga psicotrópica, pois atua no sistema nervoso central, provocando mudanças no comportamento de quem o consome, além de desenvolver dependência. Embora seja uma das poucas drogas psicotrópicas que têm seu consumo admitido e até incentivado pela sociedade, seu consumo de forma inadequada é um importante problema de saúde pública, acarretando altos custos para a sociedade e envolvendo questões médicas, psicológicas, profissionais, familiares e até do âmbito do Direito Penal.

Mesmo ingerido em pequenas quantidades, o álcool diminui a coordenação motora e os reflexos, comprometendo a capacidade de dirigir veículos ou operar outras máquinas. Pesquisas revelam que a grande maioria dos acidentes automobilísticos é provocada por pessoas que haviam bebido antes de dirigir. A legislação brasileira (Código Nacional de Trânsito, que passou a vigorar em janeiro de 1998), responsabiliza penalmente motoristas que conduzam veículos sob efeito de bebidas alcoólicas. Também acidentes de trabalho ou domésticos podem ser provocados por pessoas alcoolizadas.

Quadros clínicos sintomatológicos são creditados ao uso do álcool, como a "Alucinose Alcoólica" (presença de alucinações auditivas que acusam ou defendem o paciente em forma de diálogo), "Delírio de Ciúme" ou "Paranóia Alcoólica" que pode resultar em tentativas ou homicídio da esposa ou companheira, "Delirium Tremens" ou ainda crises familiares, decorrentes da perda de emprego ou agressões domésticas.

Crises convulsivas, amnésia e demência alcoólica estão entre os quadros clínicos decorrentes do uso de álcool, podendo ainda surgir várias doenças somáticas extra-cerebrais. As mais freqüentes são relacionadas ao fígado (esteatose hepática, hepatite alcoólica e cirrose). Também são habituais problemas do aparelho digestivo (gastrite, síndrome de má absorção e pancreatite) e do sistema cardiovascular (hipertensão arterial e problemas cardíacos). Há também casos de polineurite alcoólica, caracterizada por dor, formigamento e câimbras nos membros inferiores. Saliente-se, ainda, que o consumo de bebidas alcoólicas durante a gestação ou amamentação pode prejudicar o feto e trazer graves conseqüências para o recém-nascido. O alcoolismo pode estar associado a doenças como Diabete e Hipertensão Arterial.

Como já citado neste texto, a pessoa que consome bebidas alcoólicas de forma excessiva, ao longo do tempo, pode desenvolver dependência, condição conhecida como alcoolismo. Os fatores que podem levar ao alcoolismo são variados, envolvendo aspectos de origem biológica, psicológica e sociocultural. A dependência do álcool atinge cerca de 10% da população adulta brasileira.

O tratamento da doença denominada alcoolismo é tarefa árdua. Tem como objetivos desintoxicar o alcoolista, aliviar a ansiedade e inquietação motora, fazer com que haja remissão dos sintomas alucinatórios ou delirantes, diminuir a compulsão pela ingestão de álcool e tratar as enfermidades somáticas desencadeadas pelo uso excessivo e crônico desta droga. A psicoterapia, individual ou de grupo, como suporte psicológico para a elaboração dos conflitos psíquicos vivenciados pelo alcoolista, bem como a assistência psicoterápica ou orientações à família do dependente, assumem papel de grande relevância no tratamento. O acompanhamento a nível ambulatorial por uma equipe capacitada e experiente em tratamento de alcoolismo, do qual o psiquiatra sempre faz parte, é de suma importância no controle em longo prazo dessa enfermidade. Durante o tratamento, na modalidade internação, do portador do alcoolista em uma unidade hospitalar especializada e após sua alta, é de grande valia a atuação de grupos de ajuda como a organização Alcoólicos Anônimos (AA).

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